Carolina Antunes/PR
A dois meses e meio do final de seu governo, o presidente Michel Temer criou um grupo de combate ao crime organizado e delegou o seu comando ao ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), o general do Exército Sérgio Etchegoyen.
De acordo com o Decreto 9.527/2018, publicado no Diário Oficial da União na última terça-feira (16), a chamada Força-Tarefa de Inteligência vai analisar e compartilhar dados para produzir relatórios "com vistas a subsidiar a elaboração de políticas públicas e a ação governamental no enfrentamento a organizações criminosas que afrontam o Estado brasileiro e as suas instituições".
O grupo que será comandado por Etchegoyen terá representantes da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), das Forças Armadas e dos ministérios da Segurança Pública e da Fazenda. Os órgãos terão dez dias, a contar da data de publicação da norma, para indicar ao todo 11 representantes titulares e outros 11 suplentes. Como é considerada uma prestação de serviço público relevante, a atividade não será remunerada.
Poder ao general
A publicação do decreto próximo ao encerramento do governo Temer e a pouco mais de uma semana do segundo turno causou estranheza entre especialistas da área militar ouvidos pelo Congresso em Foco.
Eles questionam o novo poder dado a Etchegoyen, o teor genérico do decreto – que não define o que será considerado crime organizado nem delimita o grau de atuação do grupo – e a possibilidade de o trabalho da força-tarefa entrar em conflito com as investigações da Polícia Federal contra políticos e integrantes do próprio governo.
Discreto e bastante ativo nos bastidores, Sérgio Etchegoyen tem tido cada vez maior protagonismo no governo Temer. Este ano ganhou destaque na intervenção federal na área da segurança pública no Rio e nas negociações da greve dos caminhoneiros, que pararam o Brasil no final de maio. Ele chegou a ser convidado pelo ministro da Secretaria de Governo, Carlos Marun, a se filiar ao MDB para disputar a Presidência da República. Mas recusou o convite, alegando que não pretende trocar a vida militar pela política.
Olhar crítico
Para o advogado especialista em Direito Público Antonio Rodrigo Machado, se o objetivo do grupo for mesmo subsidiar a elaboração de políticas públicas e a ação governamental no enfrentamento a organizações criminosas, a medida pode ser considerada positiva. “O diálogo entre as instituições que têm informações ligadas à segurança pública é questão estratégica em nosso país. Somos um continente em termos territoriais e com muitas ‘polícias’ diferentes e vinculadas a entes federativos distintos. Estabelecer ferramentas de diálogo é algo muito importante”, disse ao Congresso em Foco.
O problema, segundo Antônio Rodrigo, é se houver outra intenção por trás da atuação da frente de trabalho. “Agora, se existe outro objetivo para além disso não dá pra interpretar pelo contexto legal. A lei não dá espaço pra isso. Mas estamos num contexto em que a democracia vive sob ataque. Precisamos observar a força-tarefa de inteligência a partir de um olhar crítico constante”, adverte. O advogado faz alusão à possibilidade de o deputado e capitão da reserva Jair Bolsonaro (PSL) se eleger presidente no próximo dia 28.
O Congresso em Foco procurou a Presidência da República, o GSI e o Ministério da Segurança Pública para questioná-los sobre o decreto. Não houve retorno ainda. A reportagem será atualizada assim que os órgãos se posicionarem.
Veja a íntegra do decreto:
"Decreto 9527/18 | Decreto nº 9.527, de 15 de outubro de 2018
Cria a Força-Tarefa de Inteligência para o enfrentamento ao crime organizado no Brasil.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, caput, inciso VI, alínea a, da Constituição, DECRETA:
Art. 1º Fica criada a Força-Tarefa de Inteligência para o enfrentamento ao crime organizado no Brasil com as competências de analisar e compartilhar dados e de produzir relatórios de inteligência com vistas a subsidiar a elaboração de políticas públicas e a ação governamental no enfrentamento a organizações criminosas que afrontam o Estado brasileiro e as suas instituições. Ver tópico
Art. 2º A Força-Tarefa de Inteligência para o enfrentamento ao crime organizado no Brasil será composto por um representante, titular e suplente, dos seguintes órgãos:
I - Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, que o coordenará;
II - Agência Brasileira de Inteligência;
III - Centro de Inteligência da Marinha do Comando da Marinha do Ministério da Defesa;
IV - Centro de Inteligência do Exército do Comando do Exército do Ministério da Defesa;
V - Centro de Inteligência da Aeronáutica do Comando da Aeronáutica do Ministério da Defesa;
VI - Conselho de Controle de Atividades Financeiras do Ministério da Fazenda;
VII - Secretaria da Receita Federal do Brasil do Ministério da Fazenda;
VIII - Departamento de Polícia Federal do Ministério da Segurança Pública;
IX - Departamento de Polícia Rodoviária Federal do Ministério da Segurança Pública;
X - Departamento Penitenciário Nacional do Ministério da Segurança Pública;
XI - Secretaria Nacional de Segurança Pública do Ministério da Segurança Pública.
§ 1º Os representantes de que trata este artigo serão indicados pelos titulares dos órgãos referidos nos incisos I a XI do caput, no prazo de dez dias, contado da data de publicação deste Decreto, e designados em ato do Ministro de Estado Chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República.
§ 2º A Força-Tarefa de Inteligência para o enfrentamento ao crime organizado no Brasil poderá convidar representantes de outros órgãos e entidades da administração pública federal cujas participações sejam consideradas indispensáveis ao cumprimento do disposto neste Decreto.
Art. 3º O Coordenador da Força-Tarefa de Inteligência para o enfrentamento ao crime organizado no Brasil elaborará Norma Geral de Ação que regulará o desenvolvimento de ações e de rotinas de trabalho, em consonância com a Política Nacional de Inteligência - PNI, com a Estratégia Nacional de Inteligência - ENINT e com a legislação em vigor.
§ 1º A Norma Geral de Ação definirá a forma de articulação e de intercâmbio de informações entre a Força-Tarefa de Inteligência para o enfrentamento ao crime organizado no Brasil e o Conselho Nacional de Segurança Pública e Defesa Social.
§ 2º A Norma Geral de Ação será submetida à deliberação dos integrantes da Força-Tarefa de Inteligência para o enfrentamento ao crime organizado no Brasil e, na hipótese de ser aprovada, por maioria absoluta, será publicada no Diário Oficial da União por meio de Portaria do Ministro de Estado Chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República.
Art. 4º A Agência Brasileira de Inteligência prestará o apoio administrativo à Força-Tarefa de Inteligência para o enfrentamento ao crime organizado no Brasil.
Art. 5º A Força-Tarefa de Inteligência para o enfrentamento ao crime organizado no Brasil realizará reuniões de trabalho, em caráter ordinário, semanalmente, ou em caráter extraordinário, por convocação do coordenador, sempre que necessário.
Parágrafo único. As reuniões de trabalho da Força-Tarefa de Inteligência para o enfrentamento ao crime organizado no Brasil independerão de quórum mínimo para serem realizadas.
Art. 6º A participação na Força-Tarefa de Inteligência para o enfrentamento ao crime organizado no Brasil será considerada prestação de serviço público relevante, não remunerada.
Art. 7º Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 15 de outubro de 2018; 197º da Independência e 130º da República.
MICHEL TEMER
Sergio Westphalen Etchegoyen
Este texto não substitui o publicado no DOU de 16.10.2018"
*CongressoemFoco
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