Mauro Benevides Filho e Paulo Guedes, ambos economistas, não poderiam ter histórias mais diferentes. Com a vitória de Jair Bolsonaro, Guedes se tornou ministro da Economia. E o cearense foi eleito deputado federal pela primeira vez – e é o mais cotado para presidir a comissão que vai avaliar a Reforma da Previdência na Câmara.
Em comum, tanto o pedetista quando o guru do PSL defenderam durante as eleições a capitalização como alternativa à Previdência. Guedes como o ‘posto Ipiranga’ de Bolsonaro, e Benevides como o principal conselheiro de Ciro Gomes.
Secretário da Fazenda por 12 anos em três governos diferentes, Benevides é uma das raras vozes da oposição a não torcer o nariz para a necessidade de uma reforma na Previdência. Pelo contrário, tem procurado explicar suas ideias em detalhes, no plenário e em entrevistas.
O desafio de longo prazo, diz, é construir um sistema igualitário, financeiramente equilibrado e sustentável. E o mais urgente é salvar os Estados mergulhados na crise fiscal.
Benevides defende um modelo baseado em três pilares: assistência social, repartição e capitalização. Para o deputado, o trato entre gerações do modelo de repartição está com os dias contados, porque há cada vez menos jovens para financiar uma massa crescente de trabalhadores inativos.
Com o texto da reforma na mesa, ele é enfático em criticar o modelo à la Chile de Paulo Guedes. A solução, diz ele, é um modelo misto, que proporcione uma transição gradual à capitalização sem esfolar as contas do governo.
Um exemplo é o sistema nocional da Suécia, sob o qual os trabalhadores constroem “saldos” ao longo da carreira. “É um sistema que tem um desenho de repartição, mas no fundo é de capitalização. Ele tem, dentro do bolo da repartição, uma ferramenta gráfica que identifica o valor de contribuição”.
Em entrevista a CartaCapital, Benevides comentou os pontos mais controversos de proposta. Confira a seguir.
CartaCapital: O que mais chamou a atenção na primeira leitura do texto?
Mauro Benevides Filho: A proposta do governo não prevê a contribuição patronal. E isso nós não podemos aceitar, e vamos blindar. Esse é o primeiro ponto antes de discutir se são 65, ou 62 anos. Ou se são quarenta anos de contribuição. A imprensa inteira, em vez de discutir qual o modelo adequado para a Previdência, está dedicando muito espaço a essas regras.
CC: Você e Ciro defenderam o regime de capitalização durante as eleições. A proposta do Paulo Guedes atende ao que o PDT imaginava?
MBF: Nós propusemos que, acima de um determinado valor, haveria a capitalização de contas individuais. Com a contribuição do trabalhador e a contribuição patronal, que é o modelo de 60 países que eu pesquisei. O Paulo Guedes está se inspirando no modelo do Chile. Lá, não há contribuição patronal. Foram tantas greves e tantas manifestações que até o Chile está propondo agora, nesse momento que eu lhe falo, uma alíquota patronal para reforçar os ganhos dos trabalhadores.
CC: E na questão de assistência social?
MBF: Nossa proposta tinha um pilar de assistência social de um salário mínimo. Eles estão propondo um pilar de 400 reais, e só a partir de 70 anos. Segundo, nós propusemos um modelo de repartição, remodelado, para quem ganha até 4 mil reais. E, a partir de 4 mil reais, um regime de capitalização de contas individuais com dupla contribuição. Já ele quer para os novos trabalhadores um regime exclusivo de capitalização de contas individuais.
CC: Embora pareça branda à primeira vista, essa capitalização alternativa, e não complementar, destrói a Previdência, não?
MBF: Ele está acabando com o regime de repartição em troca de regime de capitalização sem contribuição patronal. E isso não está certo. O valor da aposentadoria fica muito pequeno. Para dar um mínimo de confiança para as pessoas que ganham até 4 mil reais, precisamos de um pilar de repartição remodelado.
CC: Deputados do PDT falaram em ‘botar o pé’ na idade mínima.
MBF: Pode ser 63, 60… o Congresso ainda vai arbitrar isso. Pode ser diferente. Minha preocupação agora é definir o modelo para deixar na Constituição. O modelo da Constituição tem que estar muito claro: ‘fica instituído o regime de capitalização de contas individuais, com contribuição patronal e do trabalhador’, aí sim. Podemos deixar para decidir a alíquota e outros detalhes via Lei Complementar. Mas sem prever um modelo, nós não vamos aceitar.
CC: Como tem sido a repercussão do texto entre os deputados?
MBF: Foi uma repercussão muito ruim. O do BPC [Benefício de Prestação Continuada] então, foi um desastre. A falta de contribuição patronal e o com descaso com os idosos foram muito criticados. Outro problema é o regime próprio dos professores. Para se aposentar com salário integral, uma professora vai ficar quarenta anos em sala de aula? É de arrasar, uma mudança muito radical.
Foi uma repercussão muito ruim. O do BPC [Benefício de Prestação Continuada] então, foi um desastre
CC: Acha que essa reforma atende ao problema dos Estados?
MBF: Alguns Estados que defendem o início do debate, só topam fazer depois da chegada da proposta dos militares. O governo prometeu enviar [a proposta] no dia 20 de março. Oito estados já têm alíquota de 14%, inclusive o Ceará. Então, não é nenhum novidade. Os outros dezenove vão ter que partir para a letra mínima de 14%. Não há nenhuma crítica contra isso.
CC: O PDT prepara estratégias para explicar melhor a Reforma. A que pé está essa ideia? MBF: Eu produzi uma cartilha, traduzindo melhor as novas regras. O que nós queremos mostrar como é hoje, e como fica, ponto a ponto. Como é muita informação, e a população não está dominando esse tema.
Fonte: Carta Capital
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