Por maioria, os ministros decidiram na última terça-feira, 24, remeter à Justiça de São Paulo os trechos da delação de ex-executivos que relatam fatos sobre as reformas no sítio de Atibaia e o terreno onde seria sediado o Instituto Lula.
Segundo a reportagem apurou, advogados com clientes alvos da Lava Jato pretendem esperar a publicação do acórdão do julgamento da Segunda Turma para avaliar se também entram com pedidos similares ao da defesa do petista.
Inicialmente, como o caso do triplex é apontado como uma propina da OAS, a decisão da turma não teria influência direta na condenação de Lula. No entanto, especialistas apontam que o entendimento firmado ontem reforça o argumento dos advogados do petista de que Moro não tinha competência para julgar o processo, por não ter relação direta com os crimes cometidos no âmbito da Petrobras. Lula está preso desde o início de abril pela condenação no caso do triplex.
Na resposta aos embargos de declaração contra a sentença, Moro escreve que a propina para Lula, na forma do apartamento, não tem ligação explícita com o escândalo de corrupção da estatal. “Este Juízo jamais afirmou, na sentença ou em lugar algum, que os valores obtidos pela construtora OAS nos contratos com a Petrobras foram utilizados para pagamento da vantagem indevida para o ex-presidente”, diz o magistrado na sentença.
O advogado Adib Abdouni destaca que a resposta de Moro é um ponto central para a defesa de Lula tentar anular no Superior Tribunal de Justiça (STJ) sua condenação, a partir dos fatos novos que surgiram com a decisão do Supremo.
Para Adib, com isso, ganha força a argumentação que a defesa de Lula traz nos recursos aos tribunais superiores, apresentados nesta segunda-feira, 23. O advogado alerta que a defesa inclusive tem justificativas para pedir, através de medida cautelar, o efeito suspensivo da condenação no STJ ou STF. “Como existem elementos que possam vir a anular todo o processo, eles têm argumentos para conseguir essa liminar”, entende o advogado.
“Gera no mínimo dúvida a respeito da competência do juiz de Curitiba, a partir da decisão de ontem. Se a delação referente a fatos não relacionados com a Petrobras não deveriam estar em Curitiba, por que outros (sem relação explícita) deveriam estar lá?”, questiona o professor João Paulo Martinelli, do Instituto de Direito Público de São Paulo (IDP-SP).
O advogado criminalista Fernando Castelo Branco lembra que, nos recursos apresentados em Cortes Superiores, a defesa não pode apresentar argumentos inéditos. “A competência de Moro é contestada desde o início do processo. Esse argumento já foi apresentado”, destaca o especialista.
“É uma questão que todos nós, advogados, mesmo quem não trabalha na Lava Jato, esperava. Esperávamos uma decisão dessa há muito tempo. Infelizmente, criou-se no Brasil a figura do juiz nacional, o juiz com jurisdição nacional. Quase um juiz de exceção”, disse o advogado Antonio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, que tem como clientes investigados pela Lava Jato.
Em curso
Lula é réu em duas ações penais que investigam os fatos em torno do sítio de Atibaia e do terreno do Instituto Lula, que tramitam na 13ª Vara Federal de Curitiba, sob o comando de Moro. Especialistas entendem que ainda é cedo para concluir que as investigações devem sair das mãos de Moro e do Ministério Público Federal no Paraná. Apontam, no entanto, que há grandes chances disso acontecer, a partir da decisão do Supremo.
“Será um momento de ajuste, em que Ministério Público de São Paulo deverá avaliar se é competente para tocar as investigações, em função da decisão do STF”, explica Castelo Branco, destacando que não podem haver investigações sobre os mesmos fatos tramitando na Justiça Federal de São Paulo e do Paraná.
Se as duas jurisdições entenderem que têm competência para tocar as investigações, provavelmente quem iria decidir sobre o conflito é o Tribunal Regional Federal da 3° Região, que abrange São Paulo e Mato Grosso do Sul, aponta o advogado. Se a decisão no tribunal é questionada, quem analisará a competência é o STJ. “Mas não haveria muito espaço para o juiz Sérgio Moro questionar essa competência”, diz Castelo Branco, considerando o novo entendimento do STF.
Especialistas e ministros dos tribunais superiores ouvidos reservadamente pela reportagem, ponderam, no entanto, que é preciso conferir como a decisão da Segunda Turma sairá do Supremo, se irá estabelecer limites e parâmetros quanto a atuação de Moro em torno do uso das provas decorrentes da delação.
Se as investigações continuarem com Moro, Martinelli destaca que as provas usadas na instrução do processo podem ser questionadas pela defesa.
“No processo penal há a chamada teoria dos frutos da árvore envenenada. Se uma prova não poderia ser usada, e dessa prova outras foram obtidas, essas novas provas ficam contaminadas, exceto quando elas são obtidas por outro meio”, explica o professor do IDP, referindo-se as provas que foram obtidas através do acordo de colaboração fechado com ex-executivos da Odebrecht no início de 2017.
* Época.
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